quarta-feira, 22 de julho de 2009

Mora na filosofia


Do pouco que eu conheço de filosofia confesso que tenho uma certa implicância com Aristóteles, que foi discípulo de Platão que, por sua vez, foi discípulo de Sócrates. Sei muito bem da importância dos 3, que até hoje influenciam nosso modo de pensar. Principalmente cá pelas bandas do Ocidente. Mas se hoje o conhecimento humano é este conjunto de múltiplas disciplinas, estudadas cada uma por um tipo de especialista, muito se deve a Aristóteles e à sua mania de sair por aí denominando tudo. Numa boa, o cara deve ter sido um dos primeiros a sofrer de TOC - transtorno obsessivo compulsivo.
Lembrei disso no domingo ao final da tarde, na casa do Raul, conversando com Fred e Rodrigo, outros dois amigos, acompanhados de um delicioso doce de banana feito na hora. Por mim, claro. O Rodrigo falava sobre as muitas e já conhecidas manias de seu pai, entre tantas, a de ter tudo organizado no porta-luvas do carro. Não importava se era na Variant azul 1972 ou no Del Rey da década de 90, a gente encontrava desde uma simples lixa de unha - é, o pai do Rodrigo tinha uma coleção de lixas de unha e não me perguntem o por quê - até caixa de ferramentas e sacos de vômito. Tudo devidamente embalado e milimetricamente guardado. E não estou exagerando. Parece que agora, depois de uma certa idade, a coisa piorou. E mais: Rodrigo já se deu conta que também sofre do mesmo mal. "Isso a gente já sabia", retruca Raul.
Aí eu comecei a pensar nas figuras que já cruzaram meu caminho e que, de certo, sofrem de TOC. Ângela, uma amiga da minha mãe, e sua insuportável mania de limpeza; um filho de uma prima e sua paranóia em lavar as mãos o tempo todo; o rei Roberto Carlos e sua infinidade de esquisitices; a ex-secretária da produtora onde minha cunhada Cris trabalhava e seu excesso de preocupação com as agendas de todos os funcionários; uma vizinha do prédio em que eu morava quando solteiro e sua curiosidade interminável pela vida dos outros; uma ex-professora de inglês e sua cobrança absurda por um sotaque perfeitamente britânico; e por aí vai.
Interessante é que num primeiro momento a gente pode até nem se dar conta e mesmo achar engraçadas as manias de um ou de outro, mas depois, com um convívio mais estreito, o que era engraçado fica chato pra caramba. Imagina ter uma pessoa o tempo todo pegando no seu pé por conta de uma poeirinha de nada em cima do móvel ou a irritação de ter ao seu lado uma criança querendo lavar as mãos sem parar? Aí eu paro e penso se também não sofro deste tal de TOC. Se bem que acabo de lembrar da desordem do meu armário e da bagunça das minhas gavetas e não. Definitivamente eu não sofro deste mal. Já o Aristóteles...

segunda-feira, 20 de julho de 2009

Usando máscaras


Uma das minhas duas sócias é atriz. Na verdade as duas são, só que a outra é mais chegada numa direção do que em qualquer outra coisa. A que se assume atriz 24 horas por dia chegou dia desses com um visual diferente, cabelos cortados e com a tal da escova progressiva que vai lhe garantir cabelos lisos por alguns meses. Ficou ruim não. Bacana até. Mas o mais impressionante foi a mudança de comportamento e mesmo no jeito de se vestir. Eu disse que ela parecia outra mulher e que me fazia lembrar a minha avó materna nas fotos dos anos 20 com aquele cabelinho curtinho alisado. Ela me disse que necessita encarnar personagens diferentes. Sempre. Caso contrário sua vida perde todo o sentido.


Foi aí então que me fez pensar mais uma vez em tudo aquilo que tenho pensado nesses últimos meses. Por que será que a gente precisa estar sempre representando um personagem? Por que será que não nos basta sermos nós mesmos? Por que é tão difícil não usarmos máscaras? Que raio de realidade é esta que resolvemos criar para nós mesmos? Isso tudo dá um nó na minha cabeça, confesso. Ainda mais agora que resolvi atender aos apelos dos mais chegados e estou lendo um livro de autoajuda chamado "Um novo mundo - Despertar de uma nova consciência", de um tal de Eckhart Tolle. O livro é bom pra quem anda numa fase péssima feito eu, quando nada - ou quase nada - parece dar certo; quando os quarenta anos se transformam numa pequena crise; quando as oportunidades parecem sumir; quando o mundo parece ruir; quando tudo está uma merda.


É aí que eu paro e penso qual foi o personagem que encarnei todos estes anos. Ou se não encarnei personagem algum, começo a achar que deveria ter encarnado. Até porque eu vejo que estou sempre rodeado de gente que encarna um personagem atrás do outro e está sempre bem, com suas vidinhas caminhando como elas devem caminhar. Lembro que uma vez uma astróloga, Cristina Tolentino, ao ler meu mapa astral há quase 20 anos, me disse que eu deveria aprender a usar máscaras vez ou outra. Eu achei aquilo esquisito pra caramba, mas com o tempo fui entendendo o que ela quis me dizer. Só não sei se nestes 20 anos que se passaram eu aprendi a usar as tais máscaras. Acho que não. Ou então o personagem que interpreto se faz de cego e banca o bonzinho, o bobo da corte. E eu odeio gente boazinha demais. Na verdade tenho odiado cada vez mais esse tipinho. Será que é isso que tem me deixado insatisfeito comigo mesmo? O fato de descobrir agora, aos 40 anos, que vivi este tempo todo fazendo o papel do bonzinho?

- Senhor diretor, me arruma outro personagem pra eu interpretar nesta história, por favor!


- Que outro personagem? Acho melhor mudar de história, meu camarada!


Corta.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Entornando o caldo


Não sei se vocês sabem, mas eu carrego nas costas cinco campanhas políticas. A primeira foi para a Prefeitura de Mogi das Cruzes, cidadezinha do Alto Tietê, em São Paulo, lá pelos idos de 2004. Depois, em 2006, elegi alguns deputados estaduais e federais, também em São Paulo, e voltei a tempo de me engajar no segundo turno pelo governo do estado do Rio, quando trabalhei para a candidata Denise Frossard. Perdi. Em 2008 comecei fazendo a campanha para a Prefeitura de São Gonçalo, mas logo fui arrebatado para Juiz de Fora, onde, junto com a equipe da Eurofort, elegemos o prefeito numa virada histórica. Durante quase todo o primeiro turno estivemos em terceiro lugar, mas com muita garra e determinação conseguimos levar as eleições para o segundo turno, transformando um candidato do PSDB, até então considerado de elite, no candidato mais popular das eleições, derrotando a candidata do PT, que carregava a fama de novidade, de renovação, de ética e tudo mais a que estamos acostumados a ouvir o PT se autointitular. Tudo artimanha do marketing político, podem acreditar.

Entre uma campanha e outra eu invento um documentário pra fazer, um festival de cinema pra produzir, uns curtas-metragens pra dirigir e outros tantos roteiros que um dia podem virar qualquer coisa. Do ano passado pra cá inventei de abrir uma produtora com mais 5 amigos, a Rastros Filmes - http://www.rastrosfilmes.com.br/ - e desde então tenho tentado emplacar algum projeto pra ver se entra alguma grana. Confesso que está difícil, ainda mais com 5 sócios, cada um pensando de uma maneira diferente e sempre com alguma opinião que pode mudar tudo ou empacar tudo de uma hora para outra. Isso cansa. Mas o pior é quando um dos sócios, no caso sócia, se acha a dona da razão e muitas vezes assume uma postura acima do bem e do mal, como se só o que ela pensa deveria prevalecer, só quem ela conhece é gente boa, só depois que ela dá a palavra final é que vale. Na verdade isso tem me dado a maior preguiça, expressão que aprendi com ela, aliás. Até porque eu, que muitas vezes não deixo transparecer de cara, mas também tenho cabelinho nas ventas, fico pra morrer e não tenho deixado as coisas passarem em branco, ou melhor, não tenho concordado com as decisões e as posturas da figura em questão. E é aí que o caldo entorna.

E o caldo entorna também quando abro a porta de casa e vejo estampadas nas primeiras páginas dos jornais O Globo e Folha de S.Paulo, os que assino, fotos do nosso presidente Lula praticamente nos braços - ou no colo, talvez - de Fernando Collor e Renan Calheiros, além das mais variadas desculpas em favor de Sarney ou de todos os acontecimentos que envergonham e maculam a imagem do Senado Federal. Quem me conhece sabe que eu já fui petista de carteirinha, daqueles que andava com uma estrela vermelha pendurada na mochila e discursava a favor do operário que sonhava em um dia chegar à presidência. O episódio do mensalão e as desculpas de Lula dizendo que não sabia de nada serviram para dissolver o sentimento de esperança que eu tinha em ver meu país ser comandado por um cabra do povo, com todo o discurso da moral e da ética, eleito pelo povo, que queria mais moral e mais ética e coisa e tal. Tenho amigos como o Raul, por exemplo, que ainda acreditam no Lula, e dizem que governar é assim mesmo e que quem está no poder tem de fazer suas concessões. Alto lá. Toda e qualquer concessão tem lá seu limite. Eu até concordo que a vida esteja um pouco melhor para os menos favorecidos. Basta viajarmos pelo interior do nosso Brasil para vermos as melhorias. Mas nem por isso posso achar que o bolsa isso ou bolsa aquilo seja o antídoto pra todo o mal brasileiro. Muito pelo contrário. Ou se dá o peixe ou se ensina a pescar, não é não? E eu não tenho visto ninguém por aí ensinando a pescar nada. E também não posso concordar com a arrogância e o ar de superioridade daquele que se considera o nosso líder.

Eu não gosto de ter líderes e também nunca tive um ídolo sequer. Sou daqueles que acredita em criação coletiva, em parcerias, em igualdade de expressão. Pode parecer utopia mas é de verdade. E quando esbarro com arrogância e falta de humildade fico com a maior preguiça. E isso vale tanto para presidentes como para sócios, sabe?

quarta-feira, 15 de julho de 2009

O caldo é verde


Fui num casamento sexta-feira e encontrei com a Lena, uma prima da minha mulher, que disse que sempre lê meu blog. Eu acredito. Até porque, ela engrossa o coro dos meus 20 seguidores. Papo vai, papo vem, ela aproveitou para reclamar que no meu blog, cujo título é "Eu sei cozinhar", o que menos tem é receita. Respondi que logo no primeiro post eu deixava claro que não tinha a intenção de ser nenhum José Hugo Celidônio ou de me transformar num chef de cozinha de renome internacional. Longe disso. Eu só queria um espaço para poder publicar minhas histórias e o nome do blog é só pelo simples fato de eu saber cozinhar. E ponto.

Mas já que a Lena perguntou pelas receitas _ umas outras tantas pessoas também têm perguntado_, vou aproveitar a frente fria que baixou na cidade pra publicar uma receita fácil pacas pra esquentar a temperatura. Ou o clima, se for o caso. Trata-se de um caldo verde. Confesso que até pouco tempo atrás eu achava que fazer caldo verde dava o maior trabalho. Que nada! Coisa simples, rápida de se fazer e que fica uma delícia.

Ingredientes:

1 molho de couve manteiga
4 batatas grandes
1 cebola grande
2 dentes de alho
1 paio cortado em fatias finas
Azeite
Sal e pimenta a gosto

Modo de Fazer

Descasque as batatas, a cebola e os dentes de alho. Coloque numa panela, cubra com água e leve ao fogo com um fio de azeite. Enquanto isso, fatie a couve bem fininha e reserve. Quando a batata estiver cozida (espete com um garfo) desligue o fogo. Espere esfriar uns cinco minutinhos e bata tudo no liquidificador. Depois de batido, volte o creme de batatas para a panela e junte a couve e o paio fatiados. Deixe ferver por mais 10 minutos e mande ver. Se não se ligar com esse papo de calorias, acompanhe com umas torradinhas. Esta receita rende umas 6 porções.

Se quiser variar, ao invés de couve você pode colocar alho poró ou agrião ou aspargos ou mais o que a sua imaginação mandar. Neste caso, dispense o paio. Ou não.

Bom apetite.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Ninguém é o que é ou O fantasma de Eva Klabin


"Ninguém é o que é, todo mundo está só sendo alguma coisa" foi o que ouvi de um amigo meu ontem à tarde. Ele se referia às pessoas que conheceu durante os seis meses em que morou em Londres, onde a febre de ter de fazer dinheiro é a doença que afasta cada um de seu cada um. Ele me contou também que conheceu muita gente com talento para ser muita coisa, mas que para sobreviver faziam mesmo era qualquer coisa. Afinal, estavam em Londres e Londres não é qualquer lugar do mundo. É a terra das princesas e rainhas, do príncipe e sua amante, de Beatles e Rolling Stones, do Radiohead e mais o que nossa mente considerar alternativo ou de vanguarda. Eu tenho a maior vontade de conhecer Londres.


Este meu amigo me disse ainda que passar uma temporada em Londres é como passar pelo purgatório e que se você sobrevive àquela selva sua vida nunca mais será a mesma depois. É como um estágio, ele disse. Um estágio que eu nunca vou fazer, diga-se de passagem, pois se é pra passar por purgatório, que pelo menos eu esteja perto daqueles que amo, falando a língua que eu domino, pisando em terras que eu conheço. Cada vez mais eu tenho certeza de que não vim parar nesta vida pra resolver minhas questões longe de tudo aquilo que tenho como referência. E aqui não há um tom de crítica a quem escolhe ou se vê obrigado a escolher viver num outro país. Acho que se eu não tivesse me casado tão cedo também encararia uma aventura destas. Hoje, aos 40 anos e com 3 filhos, não mais. Quero, sim, conhecer Londres, visitar a Tate Modern, os pubs, passear em Candem Town e procurar saber se é verdade que o Reino é unido. E só. Até porque, em termos de vanguarda e produção artística, hoje em dia vejo mais Berlim como pólo cultural do que qualquer outra cidade da Europa. E este meu amigo também.

Por falar em vanguarda e produção artística, semana passada estive num evento no Cine Glória chamado Capacete, que a cada 15 dias reúne alguns artistas plásticos para conversarem a respeito de suas produções e de seus processos criativos. O convidado da noite era o artista plástico Ernesto Neto, de quem eu já conhecia alguma coisa, porém nunca tinha participado de um papo cara a cara com ele. Figuraça, completamente descabelado e amarrotado, Ernesto é daqueles que tem muito o que falar e a plateia fica completamente hipnotizada por ele. Quem estava presente pode ver slides com suas obras e ouvir como aquilo tudo ia surgindo, desde os materiais usados até ao que tinha dado errado. Além da generosidade, que em muito me fez lembrar do meu querido e saudoso amigo Sérgio Bernardes, o bom humor também é peça fundamental na vida do artista. Prova disso foi a história de sua instalação na Fundação Eva Klabin, há 5 ou 6 anos, quando cobriu de lençóis brancos todas as obras de arte existentes na casa por "achar aquilo tudo lá muito careta" e teve a certeza de que o fantasma de Eva Klabin existe e vive nos cômodos da Fundação. Isso porque os seguranças de lá falam dela como se ela estivesse viva, talvez com medo de que ela puxe os pés deles durante os cochilos noturnos.

E enquanto eles cochilam eu continuo querendo ser o que eu sou e não apenas qualquer coisa.
A foto que ilustra este post não é de nenhum fantasma, mas de Eva Klabin ainda jovem. A Fundação que leva seu nome foi criada em 1990, um ano antes do seu falecimento, fica no Rio de Janeiro, mais precisamente no bairro da Lagoa. Maiores informações no site www.evaklabin.org.br.