domingo, 14 de fevereiro de 2021

E daí?

Dia desses eu o vi atravessando a rua aqui perto de casa. Da última vez que nos encontramos ele me revelou ter fracassado no amor. Ora bolas, como se isso fosse algo raro de acontecer desde que o mundo é mundo. Eu também havia fracassado tantas vezes, confessei, e todas as vezes foram como se um véu se descortinasse bem diante dos meus olhos turvos, tantos gestos tristes, lentos, juntando pedaços de mim. 

Naqueles dias eu era metade neblina, metade temporal. 

Era como se em minhas veias corressem versos tímidos, verbos atropelados, palavras na contramão, tudo ao mesmo tempo agora. E então, eu aqui fora, me derramava em poesias de fuga, inventava uma nova rota, criava outras histórias e me escondia entre as rimas que eu mesmo trazia desde que vim parar aqui. 

É estranho, eu sei. Confuso até. 

Mas está tudo dentro de mim, assim como está tudo dentro dele também, nós dois sabemos muito bem disso. Essas coisas sufocam a gente, quase não dá pra contar. Melhor seria uma existência sem afetos, sem proximidade, sem intimidade, toque, pele, sexo, nada disso. Um pra lá, outro pra cá. Isso tudo dá muito trabalho, envolve outras pessoas, cada um é cada um, reage de um jeito, pensa diferente, enxerga assim ou assado, um quer enquanto o outro não quer. É sempre assim. Difícil. 

Já é madrugada. 

Chove sem parar nessa cidade faz mais de duas horas. 

Não teve carnaval esse ano, e daí? 

Eu sinto falta mesmo é do meu coração batendo em descompasso.  

(e de um abraço)