domingo, 27 de janeiro de 2019

Cena linda de se ver

Dia desses me dei ouvidos e te convidei para crescer comigo. Um outro eu entre tantos outros que me habitam, um laço eterno, visitas inesperadas dentro de mim, que sou feito de gestos simples, olhares úmidos, mãos dadas de repente, amigos e amores lado a lado na estrada. Era tarde quando você apareceu. Me pegou de surpresa, revelou meu lado oculto, luz na minha sombra, teu corpo que é meu corpo sobre meu corpo que é teu corpo. Nu. Fazia tempo que não nos víamos. Desde o dia em que você me disse para eu seguir meu caminho, firmar meus passos em frente, não olhar para trás e aprender com as cicatrizes, já que algumas descobertas causam mesmo muita dor. Eu já sofria terrivelmente sem falar nada para ninguém. Desde sempre tive essa mania. Só eu sabia da impossibilidade da natureza de determinadas coisas, mas mesmo assim eu continuava. Alguma coisa mandava eu não desistir. 

Teimosia. 

Dia desses me tirei para dançar. Fez-se um baile em minha vida. Meus pés rodopiavam incessantemente no salão ao som de músicas que aquele que era eu costumava cantar, lembra? Era doce a melodia cuja letra era de fato um poema deslizando nas estrofes entre as rimas que ele, que ao mesmo tempo era você e eu, escrevia enquanto animava a festa ao meu redor. Havia tantos em volta, e eles pulavam, gritavam, pareciam não querer sair de perto, não me deixavam mais sozinho, e eu ali no centro de tudo, cada vez mais calado, quieto, assustado, quase sem ar. Claustrofóbico de mim. 

Era como se eu construísse barreiras para que você e todos esses que são eu não se aproximassem. Poucas vezes me deixei chegar tão perto assim de mim. Isso é ruim, eu sei. Sempre me senti meio sozinho, fui pedra bruta abandonada na beira do rio, arco-íris decomposto em prisma, geometria das cores, aquarela, luz e sol. Eu sequer percebia quantos eus havia. Não imaginava. Não queria saber. Fiz pouco caso. Fui egoísta. Era eu e eu e eu somente o que me importava. Mas dia desses encontrei de novo com eu você. Tudo já meio diferente em mim. Em nós. Era como olhar num espelho, era como entrar naquele outro eu você ali na frente, era como dar um abraço forte, peito encostando no peito, a pele quente, coração fervendo, cena linda de se ver.  

Dia desses. 

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

Vida é sopro

Há quem goste mais das estrelas que da lua.
Há os que nem olham para o céu.
Momentos raros e a vida continua
Feito um beijo roubado.
Suas mãos sobre minha carne nua. 

Há os que gritam para todo mundo ouvir.
Há os que ferem mesmo sem sentir
Todo coração um dia foi pisado,
usado, humilhado, fica a cicatriz.
Manchas de sangue sobre meu colchão.

Há os loucos e os poetas que acreditam no amor.
Há os que nunca se permitiram amar de verdade.
Amar nada mais é que conjugar um verbo simples,
é se despir de toda e qualquer vaidade.
Vida é sopro. Amor é sorte.


terça-feira, 15 de janeiro de 2019