quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Parto sem dor


Tem gente que chora à toa e eu faço bem este tipinho chorão. Tenho pra mim que é de família, pois minha avó Altair era um poço de lágrimas, isso sem falar da minha tia Mercedes, ou tia Nêga para os mais íntimos, que chorava à simples menção da palavra "antigamente". Parecia piada, e nós, os sobrinhos-netos, por pura sacanagem, fazíamos questão de chegar perto dela e, como quem não queria nada, soltávamos um "e antigamente, tia?". Ela começava a falar e logo enrolava a língua, os olhos ficavam cheios dágua e danava a soluçar. Vai entender, né?
Minha mãe não é e nem nunca foi chorona. Só a vejo chorar quando morre alguém querido e olhe lá. Não que minha mãe seja durona. Longe disso. É das pessoas com o coração mais mole que eu já conheci, daquelas que os com caráter duvidoso adoram passar a perna. Só não é chorona. Quando pequeno lembro dela chorando junto comigo e com meu irmão por conta de um filme triste até dizer chega chamado "Imitação da vida", com a Lana Turner, uma atriz que muitos de vocês nem devem saber de quem se trata. A história? Um dramalhão da década de 50, creio, onde a filha da empregada rejeitava a mãe de todas as maneiras e só se dava conta do amor que sentia por ela no dia em que volta pra casa e encontra a pobre da mãe num caixão, sendo velada. Um horror.
A outra vez que eu lembro de ter visto minha mãe chorar foi no último capítulo da primeira versão de "Pecado Capital" (olha eu aqui entregando minha idade!), novela da Janete Clair, quando o personagem de Francisco Cuoco, Carlão, era assassinado a tiros com uma mala de dinheiro nas mãos. Era o Paulinho da Viola cantando o tema da novela na TV e minha mãe aos prantos na sala. Se não estou enganado meu irmão também chorou. E muito. Já eu não me lembro se chorei. Tenho quase certeza que não.
Resolvi escrever sobre choros e minha mãe porque esta semana estive com uma amiga que teve sua primeira filha ano passado, de parto normal, e ao relatar o parto disse que teve a impressão de ter chorado horrores, de ter gritado um outro tanto, "porque parto normal não é mole não", disse ela. Mas meses mais tarde, ao tomar coragem para ver o vídeo que o marido fez dela parindo, pode constatar que não gritou tanto assim e que o choro mais parecia manha. Esta minha amiga é grandalhona, um mulherão de 1,86m, cadeiruda e engraçada até dizer chega. Disse que se apaixonou pelo anestesista quando, ao final do parto e para aliviar as contrações, ele aplicou nela uma dose de relaxante para que ela tivesse forças para expulsar o bebê sem morrer de dor. Foi o bastante para que ela caísse de amores pelo doutor. Ela disse que os olhos ficaram vidrados no anestesista, tipo amor à primeira vista. "Ou primeira agulhada", eu completei. E tudo com o consentimento do maridão, óbvio.
Foi aí então que eu lembrei da minha mãe, que ficou famosa no Hospital da Polícia Militar em junho de 1971, quando deu à luz meu irmão. Marcelo nasceu com quase 5 quilos, um bebê enorme, ainda mais que saiu da barriga da minha mãe, uma mulher de 1,52m e de quadris estreitos. Ele teve de ser tirado a fórceps, uma espécie de gancho de ferro que enfiavam nas mulheres quando os bebês custavam a sair. Reza a lenda que minha mãe não deu um ai sequer. Nem mesmo quando a enfermeira, uma mulatona gorda, subiu em sua barriga para forçar a saída do meu irmão. Minha mãe, que desde aquela época já devia ser dona de uma fé sem tamanho, conta que fazia força enquanto mordia um pedaço de pano. E só. Ela diz que o meu parto foi mais tranquilo, que eu era um pouco menor que meu irmão e que eu não precisei de fórceps. Saí numa boa. O certo é que tanto num parto quanto no outro ela não fez escândalos, não gritou, não chorou e nem reclamou de nada. Pensavam até que ela tivesse feito curso de parto sem dor. "Que nada!", diz ela, toda orgulhosa. O certo também é que no decorrer desses 40 anos de convívio com a dona Lígia, a minha mãe, nunca ouvi ela reclamar de quase nada. E nem chorar. Não que não tivesse motivos. Mas melhor nem comentar porque daí quem vai começar a chorar sou eu. Até porque minha mãe é forte pra caramba.

2 comentários:

  1. Um dos melhores professores que tive na faculdade achava o "Imitação da Vida" o melhor filme já feito. Ele era gay.

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  2. O meu parto foi cesárea, foi ódio a primeira vista ao anestesista, a porcaria não pegou e eu senti uma dor infeliz na agulhada. Até hj sonho com um parto normal sem anestesia e em casa!

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