sábado, 17 de março de 2012

Os poetas também morrem

Não sei quanto tempo ainda vou ficar por aqui.

Ele também não sabia.

Entretanto, conhecia ele o exato instante da palavra,
a urgência da frase ainda sequer escrita,
latente em suas ideias,
fremente em suas andanças,
firme em seus pensamentos traduzidos entre tantos versos
entreouvidos no murmurar da noite
reverberados, reinventados, alucinados até.

Sobe nas mesas e declama o texto de improviso
do orador de tantas vozes que se calam
num momento em que tudo para,
em que a gente dança no palco em que se cospe e se envenena
a lucidez que paralisa e bloqueia a fantasia,
e deixa então de ser real para se tornar poesia.

Corta, poeta.

Sangra em minha carne a tua vontade.
Faz de mim o verbo mais que imperfeito
E cicatriza na minha pele o gosto da tua verdade.
Antes que eu morra e tudo que eu fui desapareça
feito comida de traça no fundo do armário
ou o pó na estante que me serve de abrigo,
eu não ligo, apenas costuro o que você rascunha.

Então, rasga, poeta.

Esgarça, procura e provoca a minha inquietude.
Porque eu sei que também vou embora qualquer hora dessas
cedo ou tarde eu não vou me importar
e que seja em pleno caos da madrugada
sob a luz da tua retina descortinada sobre minha pele,
tua mão a me tocar de leve
e tua voz a me dizer não vá não vá não vá.

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