quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Eu, que estava perto

Eles foram vistos juntos pela última vez na esquina da Rua do Teatro com Senhor dos Passos, bem ali atrás do João Caetano, num começo de madrugada de lua ainda cheia num céu limpo, ao som de um jazz acadêmico e entre caminhões e mais caminhões de uma obra da prefeitura. Foi rápido. Eu, que estava perto, tive a chance de reparar que eles pouco se falaram. Sequer se encostaram. Não pareciam nervosos, mas emocionados. Os dois se olhavam com ternura.


Havia amor ali.

Até então ninguém sabia que eles haviam marcado uma despedida e muito menos que eles tinham um caso e que este caso já estava rolando há quase um ano. Feito a morte anunciada, eles marcaram na agenda uma data para aquele amor terminar. Nenhum dos dois podia continuar com aquilo, diziam. Prometeram um ao outro guardar na lembrança tudo o que viveram enquanto estiveram juntos. Prometeram um não esquecer do outro. Prometeram tentar ser felizes e tantas outras coisas. Portanto, aquela seria a derradeira, a última vez e nunca mais.


Idiotice.


Todo mundo sabe que não se deve bolinar com essas coisas de coração. Sentimento é um terreno onde não se brinca, porra. Não dá pra chegar de uma hora para outra e dizer que no dia tal o amor vai acabar. Não é assim que funciona. Seria absurdamente fácil. Cômodo. Indolor. Simplório demais. Não seria o que conhecemos por aí como amor. Seria qualquer outra coisa. Até porque, amor bom é aquele que machuca, que deixa doer a saudade, que aperta o peito, que sufoca.


Vai ver é por isso que tem gente que morre de amor.


Não. Nenhum dos dois morreu, tenho certeza. Apenas nunca mais foram vistos juntos desde aquela madrugada, quando um deles, não me lembro qual, já achava que tudo ficaria ainda mais complicado depois que eles deixassem de se ver. O outro dizia ter medo do que iria encontrar pela frente, sabe-se lá onde. Eu, que estava perto, tive a sensação de que naquele momento já pairava nos dois a desconfiança de que aquela história deveria ter um outro fim. Se eu fosse íntimo deles, teria dado minha opinião. Mas conselho não se pede e se fosse bom, eu vendia.


- Não tem jeito. Nós sabíamos que seria hoje, um deles disse.


- Não dá para voltar atrás. Pacto é pacto, disse o outro.


Eles se olharam. Eles se abraçaram. Eles se despediram. Um deles saiu chorando que eu vi.


O outro só foi chorar mais tarde.




















Um comentário:

  1. Caraca Marcio, revivi uma história antigaça. Tinha uns vinte e poucos anos e estava perdidamente apaixonada, mas o cara tinha uma namorada antiga, ela "engravidou", ele TINHA que casar. Nos encontramos para a despedida e na volta ele parou o carro para nos abraçarmos e chorarmos. Nunca mais nos aproximamos, embora às vezes nos vejamos e, acredito que, assim como eu, ele deve pensar: COMO TERIA SIDO? Ninguém morre de amor, mas o fim dele quase... Parabéns pelo texto.

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