quinta-feira, 30 de junho de 2011

Minha fé é meu código de conduta




Na tarde daquele sábado, dia 4 de junho, quando assisti ao vivo pela tevê a entrevista coletiva em que o governador do Rio de Janeiro chamou os bombeiros de vândalos, fiquei chocado. Você pode até achar que os bombeiros realmente tenham cometido alguns excessos ao invadirem o Quartel Central e levarem mulheres e filhos menores para a manifestação. Mas nada, repito, nada justifica uma autoridade pública da importância de um governador de estado ofender toda uma corporação que sempre contou com o apoio e a simpatia da população. A mesma população que adotou as fitas vermelhas nos carros, numa impressionante demonstração de apoio à causa dos bombeiros. Demonstração, aliás, que eu não lembro de ter visto outra com tamanha força entre os cariocas em todos estes meus 42 anos de vida. Resultado: anistia para os bombeiros que haviam sido presos e a mea-culpa do governador, que disse - 25 dias depois do ocorrido - que errou ao chamá-los de vândalos. O mesmo governador que propôs criar um código de conduta para estabelecer limites nas relações entre o Executivo e empresários. Isso porque uma tragédia evidenciou a sua relação de amizade com empresários que lucram milhões em negócios com o governo. A conduta do interesse.

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Quarta-feira, 29 de junho de 2011, 15h40.


Naquela tarde eu fazia o meu trajeto habitual para chegar ao jornal quando fui surpreendido por uma cena que também me deixou chocado. Eu estava no carro, a dois quarteirões da minha casa, e vejo em frente a um prédio uma senhora desesperada com uma criança completamente ensanguentada nos braços. Levei um baita susto. Tenho horror a ver sangue e mais horror ainda a ver criança ensanguentada. Meio que por instinto parei o carro e não foi preciso mais de um segundo para que eu cedesse aos apelos daquela avó e levasse seu neto para ser socorrido num hospital. Abri a porta traseira e o cheiro de sangue e adrenalina tomaram conta do meu carro.



Dali ao hospital foram poucos minutos, mas muito desespero e aflição.


A vizinha que os acompanhava foi quem conseguiu me contar que o menino estava brincando na sala enquanto a avó estava na cozinha. De repente um estrondo. A avó corre para a sala e encontra o neto caído e sobre ele a estante e uma televisão de 29 polegadas em sua cabeça. Uma fatalidade. Lembrei dos meus filhos, do meu neto e a única coisa que conseguia dizer era para que tivessem fé e que o menino ia ficar bom. Naquele momento o que eu mais queria era que aquele menino tivesse forças para não parar de respirar e que fosse atendido a tempo. Ele não se mexia, não tinha reação alguma, a avó chorava e implorava que ele falasse com ela, a vizinha pedia calma, eu também pedia calma mas estava tão nervoso que entrei na emergência do hospital cantando pneu. A avó saltou correndo do carro, nossos olhares se cruzaram e não foi preciso dizer mais nada. Eu ainda fiquei ali parado por um instante, tentando me recuperar daquele susto e pedindo silenciosamente para que aquela história tivesse um final feliz.


Naquela tarde eu cheguei atrasado no jornal, completamente abalado com aquilo tudo que eu havia presenciado momentos antes, mas com uma sensação boa: a de ter podido ajudar alguém num momento de pleno desespero. Não deve ter sido por acaso que eu passei ali em frente àquele prédio exatamente na hora em que o menino precisava de socorro. O cheiro do sangue parecia entranhado no meu nariz e eu passei o resto do dia pedindo a Deus que salvasse aquela criança. Eu estava realmente preocupado. Mas eu estava feliz. Feliz com a minha conduta.


No dia seguinte, quinta-feira, ao passar novamente em frente ao prédio, parei o carro e perguntei ao porteiro sobre o estado de saúde do menino que eu sequer sei o nome. O porteiro disse que o estado era grave e que ele respirava com ajuda de aparelhos no CTI. Mas estava vivo, eu pensei. Na sexta estive lá de novo. Parece que está melhorando, disse o porteiro. No sábado eu soube que ele já não precisava mais de aparelho para respirar, mas que continuava no CTI. Ele vai ficar bom, eu disse para mim mesmo, porque faz parte do meu código de conduta esta estranha mania de ter fé na vida.

Um comentário:

  1. É nessa sua atitude que eu pergunto:
    Precisamos ir a igreja todo domingo para estar perto de Deus?
    Precisamos pagar o dízimo mensalmente para que Ele possa nos ouvir melhor?
    Conheço pessoas que vão a igreja todo santo domingo, mas tenho certeza que passariam batido por essa avó com seu neto quase falecendo. Mudamos totalmente o conceito da fé e da palavra de Cristo para o bem próprio e atitudes como a sua, se 10% do seu salário não foi depositado em alguma conta corrente santificada, nada mais é que um fato isolado de um pecador qualquer.

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